Julia Varady, a "Cantora-actriz"
Por CRISTINA FERNANDES
Sábado, 31 de Março de 2001

No Rivoli, com a Orquestra Nacional do Porto

As "Quatro Últimas Canções", de Richard Strauss, por uma das mais fascinantes cantoras do nosso tempo

A Orquestra Nacional do Porto terá esta noite o privilégio de acompanhar uma das mais fascinantes sopranos do nosso tempo. A romena Julia Varady, que se retirou dos palcos de ópera em 1998 para se dedicar inteiramente à gravação e aos concertos, interpreta uma das obras de culto do universo do "Lied" com orquestra - as maravilhosas "Quatro Últimas Canções", de Richard Strauss, imortalizadas por outras grandes divas, como Elisabeth Schwarzkopt ou Gundula Janowitz. Agendado para as 21h30, no Rivoli do Porto, o concerto será dirigido por Álvaro Cassuto e incluirá também a apresentação da 4ª Sinfonia, de Bruckner.

Casada com aquele que é talvez o maior cantor de "Lieder" do século XX, o lendário Dietrich Fischer-Dieskau, com quem contracenou inúmeras vezes, Julia Varady é também ela uma cantora surpreendente. Para além dos seus recursos vocais, é uma artista que prima pela inteligência, por uma aproximação quase sagrada ao texto, um imenso poder expressivo e uma força dramática desarmante. Para Varady, a beleza vocal e o brilhantismo técnico nunca foram suficientes. "O que é cantar?" É a pergunta que coloca sempre aos alunos que vão passando pelas suas "master-classes", aos quais faz questão de frisar que o acto de cantar envolve sempre "um ser humano com um passado e uma experiência própria", que deve ser colocada ao serviço de "uma situação psicológica específica". Por isso, é frequentemente identificada com o protótipo da "cantora-actriz", que faz a aproximação às personagens de dentro para fora, que vive com elas e traduz musicalmente cada "nuance" do seu estado de espírito.

A sua voz foi descoberta aos 14 anos, quando ainda vivia na Transilvânia, onde nasceu em 1941. Começou por cantar papéis agudos, mas a tessitura acabaria por baixar inesperadamente, conduzindo-a às personagens de meio-soprano de coloratura. Evoluiu depois para a categoria de "lirico spinto", isto é, um soprano lírico com capacidade de intensificação dramática, que lhe proporcionou a abordagem de um repertório muito amplo. Durante os seus tempos de estudante protagonizou diversas obras de Mozart e Puccini e participou em diversas produções nas Óperas de Bucareste e Budapeste. Em 1970 foi contratada por Christoph von Dohnanyi para a Ópera de Frankfurt, mas foi a partir de1973 que começou a causar maior sensação no plano internacional, após uma sensacional Vitélia ("Clemenza de Tito", de Mozart), no Festival de Munique.

A Bayerische Staatsoper de Munique, a Deutsche Oper de Berlim, o Covent Garden de Londres e a Staatsoper de Viena converteram-se nos palcos mais familiares de uma carreira brilhante e inteligentemente conduzida, sob a direcção de maestros tão ilustres como Barenboim, Böhm, Colin Davies, Giulini, Karajan, Kleiber, Sinopoli, Solti, Kleiber ou Swallisch. Varady cantou todo o repertório de Mozart, Verdi, R. Strauss e Wagner, em paralelo com incursões na música contemporânea - como a ópera "Lear", de Aribert Reimann - e com notáveis intervenções no domínio do concerto e do recital. Os seus últimos registos para a etiqueta Orfeo, sob a batuta de Fischer-Dieskau, com páginas de Verdi, Strauss e Wagner, são preciosos testemunhos de uma maturidade musical ímpar, vindo coroar uma importante discografia, numerosas vezes premiada pela crítica.

Julia Varady (soprano)
Orquestra Nacional do Porto
Álvaro Cassuto (direcção)
Rivoli Teatro Municipal, Porto, 21h30. Bilhetes a 2.000$00

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